domingo, 3 de abril de 2011

Ficha Limpa e a elegibilidade


Continua tendo grande repercussão a decisão do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual a denominada Lei da Ficha Limpa não podia ser aplicada relativamente às eleições realizadas em 2010. Foram muitos os artigos já publicados, inclusive na imprensa local, sobre o assunto, quase todos considerando que a referida decisão consubstanciou uma afronta à opinião pública.


Dos textos que li, entretanto, o único que colocou a questão em seus devidos termos foi o que está na revista Veja do dia 30 de março de 2011. Foi o único, aliás, que se referiu adequadamente ao dispositivo da Constituição, que ensejou o entendimento adotado pelo ministro Luiz Fux ao proferir o voto de desempate na Corte Maior.


Nos termos do art. 16 da vigente Constituição Federal, a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data da sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência.


A Lei Complementar nº 135, de 4 de junho de 2010, que foi publicada no Diário Oficial do dia 7 de junho de 2010, diz que são inelegíveis, entre outros, os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, desde a condenação até o transcurso do prazo de oito anos, nos crimes que indica. E diz que entra em vigor na data de sua publicação, mas não contém dispositivo a respeito de sua aplicação relativamente à eleição realizada em 2010.


Trata-se do estabelecimento de uma condição de elegibilidade. Condição que deveria ser exigida há muito tempo, à semelhança do que se exige de quem pretende fazer um concurso para ingressar no serviço público. Nada justifica o tratamento desigual, em favor dos que exercem cargos políticos. Não há dúvida, portanto, de que a inelegibilidade estabelecida pela Lei Complementar nº 135, com a exigência da denominada ficha limpa, constitui um importante passo no sentido da moralização da coisa pública em nosso País.


Ao Supremo Tribunal Federal cabe especialmente e em última instância a guarda da Constituição. Fazer com que prevaleçam porque hierarquicamente superiores, as regras da Constituição Federal, e entre estas está a que exige um ano de vigência da lei que altera o processo eleitoral para que possa ser aplicada. Para discutirmos o acerto do voto do ministro Luiz Fux, a questão que se pode colocar diz respeito ao alcance da regra constitucional por ele invocada. Ela se refere a lei que altera o processo eleitoral. A questão que pode ser colocada, então, consiste em saber se o estabelecimento caso de inelegibilidade é, ou não, alterar o processo eleitoral. Para os que entenderem que sim, que a definição das condições de elegibilidade compõe o processo eleitoral, a decisão do STF no caso é incensurável. Para os que entenderem que elegibilidade e processo eleitoral são coisas diversas, a referida decisão é lamentável.


HUGO DE BRITO MACHADO professor titular de Direito Tributário da UFC e presidente do Instituto Cearense de Estudos Tributários




até breve

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